Em artigo publicado nesta quarta (19/4), o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Roberto Leher, faz um convite para a participação na Marcha pela Ciência e analisa a conjuntura política e econômica do país. O evento mundial terá sua edição no Museu Nacional da UFRJ no próximo sábado, das 10h às 14h, na Quinta da Boa Vista e tem apoio nacional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Fonte: https://ufrj.br/noticia/2017/04/19/marcha-pela-ciencia-gesto-contra-ofensiva-irracionalista-no-mundo
Marcha pela Ciência: um gesto
contra a ofensiva irracionalista no mundo
Roberto Leher - Reitor UFRJ
O Brasil caminha na contramão do que seria a melhor
estratégia para enfrentar uma crise econômica: investir em conhecimento
científico, pesquisa e inovação. Não nos faltam exemplos de povos que também
passaram por momentos dramáticos nesse sentido, mas que apostaram no
fortalecimento das universidades, dos institutos públicos de pesquisa e do
aparato de Ciência e Tecnologia, por meio dos blocos de poder que se
reconfiguravam no calor das lutas sociais.
Foi assim no contexto
da Revolução Francesa, em que as grandes Écoles e universidades foram apoiadas
vigorosamente; na criação da Universidade de Berlim, que se deu em um contexto
de severa crise e de guerra; e na crise de 1929, em que a universidade
estadunidense foi ampliada progressivamente e a pesquisa foi fortalecida com
forte apoio estatal. Países como a China respondem à crise econômica mundial
com mais investimentos em ciência.
O dramático quadro da economia no Brasil ganhou
novos contornos com o agravamento da crise política. Como corolário, é tomado ainda
por uma tectônica crise de legitimidade do Executivo, da grande maioria do
Legislativo, de setores do Judiciário e de vastos segmentos da grande imprensa.
Diante de um contexto tão desolador, em que o
futuro torna-se carregado de incertezas, decisões erradas podem comprometer de
modo duradouro o porvir. Entre as muitas decisões que estão sendo tomadas
contra os direitos humanos, é preciso destacar a desregulamentação e a
flexibilização dos direitos trabalhistas, a inviabilização do sistema
previdenciário, em prol da previdência por capitalização vinculada aos bancos,
e o estrangulamento dos recursos para as universidades e os órgãos de fomento.
Embora aparentemente desconexas, as medidas que
rebaixam os direitos do trabalho evidenciam que o país estará cada vez mais
inserido em circuitos produtivos baseados nas atividades laborais simples,
prescindindo, por isso, de um robusto sistema universitário e de ciência e
tecnologia.
A planilha orçamentária das universidades federais
em 2017 é 13% inferior ao já exíguo orçamento de 2016, ano em que muitas
universidades não puderam pagar suas contas básicas. Os cortes e
contingenciamentos efetuados no Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e
Comunicações (MCTIC) em 2017 tornam o seu orçamento equivalente a menos da
metade do existente em 2005, e ainda com o agravante de que a ciência cresceu
de modo importante e o ministério não incluía a área da Comunicação: é
devastador.
E novos contingenciamentos rondam as universidades
e os laboratórios e grupos de pesquisa. A rigor, conforme as previsões
oficiais, em 2017 e 2018 não haverá recursos novos para pesquisa,
descontinuando investigações e grupos de pesquisa, em domínios cruciais como
arboviroses, energia, agricultura, saúde, educação e cultura. A retomada não será
simples.
São muitos os motivos que devem levar a sociedade a
apoiar a Marcha pela Ciência, no próximo dia 22 de abril. Mais de 500 cidades
do mundo inteiro estão mobilizadas para defender uma produção científica
independente e indispensável para a vida dos povos. No Rio de Janeiro, a
manifestação acontecerá no Museu Nacional da UFRJ e nossas universidades,
professores, estudantes, técnicos-administrativos e demais trabalhadores devem
se animar a participar do movimento.
Essa manifestação entusiasmada e crescente é
inspiradora e enche de esperança os que se dedicam de corpo e alma à ciência, à
tecnologia, à arte e à cultura. Além da luta contra o desmonte da universidade
e da pesquisa, é um gesto contra a ofensiva irracionalista que insiste em
turvar o futuro das nações. É fundamental que todos apoiem e participem das
atividades e, também, das outras manifestações públicas programadas pelos
setores democráticos em prol dos direitos sociais e, em particular, do
desenvolvimento da imaginação criadora das crianças e jovens que protagonizam a
vitalidade das instituições educacionais!
Roberto Leher
Reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ
Cidade Universitária, 19/04/2017
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